Há clara evidência de que a Educação Infantil de qualidade tem impactos positivos sobre a capacidade cognitiva de uma criança. Em alguns casos, estes impactos podem ser percebidos também nas habilidades socioemocionais, tais como atenção e disciplina.
No entanto, cada vez mais estudos científicos comprovam que nem todos programas de Educação Infantil produzem impactos significativos e duradouros. Programas de baixa qualidade, que não estimulam os alunos, podem até ter efeitos deletérios sobre o desenvolvimento.
Além do mais, alguns estudos demonstram que muitos dos benefícios encontrados nos primeiros anos da vida escolar tendem a “desaparecer” com o passar do tempo.
Isso porque, embora as crianças que iniciaram seus estudos cedo apresentem melhores resultados no curto prazo, com a continuação da vida escolar, as que entram mais tarde na escola tendem a eliminar essas diferenças iniciais.
Prova Brasil – Algumas explorações mais gerais dos dados disponíveis da Prova Brasil (referentes ao 5º e 9º ano), mesmo que limitadas, apontam para a urgência desta discussão no país.
Quadro: Nota média nas provas de Português e Matemática – Prova Brasil 2015
Fonte: Prova Brasil 2015. Elaboração: IDados.
Se tomarmos por base as características socioeconômicas (idade, escolaridade da mãe, raça, gênero e área urbana ou rural), podemos calcular as médias das notas dos alunos do 5º ano que fizeram ou não creche.
O que encontramos? Na média, alunos que ingressaram na creche obtêm 216,70 pontos na prova de Português e 228,96 na de Matemática. Já os alunos que somente iniciaram os estudos na pré-escola ou no 1º ano do Ensino Fundamental obtêm notas superiores – 218,3 e 230,2, respectivamente.
À primeira vista, este resultado parece ser puxado pela diferença de desempenho dos alunos que fizeram a pré-escola.
Se considerarmos as três etapas separadamente, alunos que não tiveram acesso a nenhuma Educação Infantil (e somente ingressaram na escola no 1º ano do Ensino Fundamental) têm desempenho inferior – na média, suas notas são 210,4 (português) e 221,6 (matemática).
Já os alunos que fizeram pré-escola antes do Ensino Fundamental têm notas maiores – 219,50 (português) e 231,53 (matemática).
O problema é que alunos que fizeram a creche antes da pré-escola parecem ter resultados, na média, inferiores aos alunos que somente fizeram a pré-escola: 214,76 e 226,87, respectivamente.
Ou seja, embora alunos que tiveram acesso à alguma Educação Infantil apresentem notas melhores do que aqueles que somente iniciaram os estudos com 6 ou 7 anos (1º ano do Ensino Fundamental), esta diferença parece vir principalmente do acesso à pré-escola.
Quando analisamos os resultados dos alunos do 9º ano, vemos que a vantagem média dos que fizeram creche parece já ter se dissipado por completo – suas notas são iguais às dos alunos que ingressaram na escola apenas no 1º ano do Ensino Fundamental.
Conclusões dependem de outros estudos – Esses resultados não permitem afirmar que a creche tenha efeito negativo ou nulo no desenvolvimento, mas podem servir de incentivo para que estudos mais rigorosos sejam realizados na área, especialmente se eles apontarem as características das creches e pré-escolas mais capazes de contribuir para o futuro escolar das crianças.
O maior problema na avaliação dos benefícios (ou não) da Educação Infantil é que conclusões de causalidade são difíceis e perigosas. Muitos fatores que influenciam os resultados escolares também podem determinar a entrada ou não de uma criança na creche.
Por exemplo, crianças de níveis socioeconômicos mais altos tendem a se sair melhor na escola, mas também são elas as que mais têm acesso à Educação Infantil (em nosso post do dia 8 de maio, mostramos que as crianças de famílias em situações socioeconômicas melhores têm maior acesso à creche).
Neste cenário, como separar o efeito direto da creche ou pré-escola do histórico e ambiente (background) familiar? Será que a creche foi fundamental no desenvolvimento das crianças ou, ao contrário, crianças com maior desenvolvimento em virtude dos estímulos familiares é que mais frequentam as creches?
As pesquisas que melhor identificam os efeitos diretos da Educação Infantil baseiam-se em programas avaliados mediante estudos experimentais que envolvem grupos de tratamento e controle bem definidos.
O exemplo mais citado é o programa Head Start, nos Estados Unidos. Estes estudos são caros e normalmente realizados com poucas crianças. Afinal, precisam acompanhar um indivíduo ao longo de sua vida escolar.
Referências:
. Berlinski, S., Galiani, S., & Gertler, P. (2009). The effect of pre-primary education on primary school performance. Journal of Public Economics., 93, 219–234.
. Currie, J., & Thomas, D. (1995). Does Head Start make a difference?. American Economic Review, 85(3), 341–364
. Currie, J., & Thomas, D. (2000). School quality and the longer-term Effects of Head Start. The Journal of Human Resources, 35(4), 755–774.
. Pinto, C. C. X., Santos, D. & Guimarães, C. (2016). The Impact of Daycare Attendance on Math Test Scores for a Cohort of Fourth Graders in Brazil. The Journal of Development Studies, DOI: 10.1080/00220388.2016.1224849.
Quadro: Nota média nas provas de Português e Matemática – Prova Brasil 2015